21 de maio de 2009

e tudo o vento levou


Um filme não é uma obra vinda do acaso. Assim como um oleiro dá pouco a pouco a forma a uma peça de barro, a produção de um filme pode atravessar algumas dificuldades e contratempos até passar por todos os processos necessários para que o possamos ver no cinema ou no ecrã do nosso televisor. O produtor David O. Selznick apressou-se a adquirir os direitos de adaptação cinematográfica de Gone With the Wind – romance de estreia de Margaret Mitchell sobre a guerra civil americana, pagando uma avultada quantia pela obra de uma escritora então desconhecida. Pretendia levar a cabo uma produção de luxo, ou não fosse ele uma das figuras proeminentes da “fábrica de sonhos" de Hollywood. A produção foi bastante atribulada, desde a escolha dos actores ao realizador. Quando Victor Fleming (O Feiticeiro de Oz – 1939 e Joana D’Arc -1948) foi contratado já algumas cenas importantes já tinham sido gravadas por George Cukor, o segundo realizador contratado por Selznick.
E Tudo o Vento Levou é um épico histórico cuja acção se inicia em 1861 no sul dos E.UA. Numa bonita e vasta propriedade chamada Tara (a norte do estado da Geórgia), Scarlett O’Hara, de ascendência irlandesa, é uma bela e caprichosa jovem bajulada por alguns jovens da sua idade, entusiasmados com a possibilidade do começo de uma guerra entre os estados do Norte e do Sul dos E.U.A. Através deles fica a saber das intenções do seu amado Ashley Wilkes em casar-se com Melanie Hamilton. Ignorando os conselhos da sua fiel criada Mammy (Hattie McDaniel), Scarlett decide ir ao baile dado pela família de Ashley para tentar demovê-lo dos seus intentos. No entanto ele prefere a feminilidade convencional de Melanie à impulsividade e vivacidade de Scarlett. por despeito ela casa com homens que não ama, mas rapidamente fica viúva. É neste baile que a jovem conhece Rhett Butler, um homem maduro, galante e com má reputação, segundo os mexericos das senhoras. Na ida a Atlanta, ao encontro de Ashley e Melanie, Scarlett reencontra Rhett, que a irrita profundamente com a sua falta de cavalheirismo, no entanto vai-se aproximando dele. A narrativa acompanha depois a história e os encontros e desencontros de Scarlett e Rhett, ao mesmo tempo que a guerra civil destrói milhares de vidas, devasta as plantações e deita por terra as instituições, os costumes e a causa dos sulistas - manter os escravos nas plantações de algodão que estavam na base da sua riqueza. Enquanto tudo isso acontece, quando admitirá Scarlett que já não ama Ashley, mas sim Rhett? Ficarão juntos e felizes?
Numa época em que os Estados Unidos ainda sofriam os duros reveses da crise de 1929, o cinema era tido como uma cultura de evasão. O público consumia com avidez filmes históricos que exaltavam precisamente a capacidade de resistir ao infortúnio que Scarlett representa. A britânica Viven Leigh foi a escolha perfeita para dar corpo à egoísta, mas destemida Scarlett; Rhett representava o herói romântico, viril, arrebatador e por vezes cínico; Ashley era o típico cavalheiro que continha os sentimentos e Melanie personificava a bondade e a complacência. Durante o filme conseguimos ver estas características que diferem o casal principal do filme: Rhett e Scarlett, do casal secundário: Ashley e Melanie, mas em ambos os casais está presente o amor romântico que o público adorava. Embora as interpretações deslumbrem, assim como os ricos cenários, este filme embeleza a complexidade da história da guerra civil ao descrever os escravos como felizes e profundamente fiéis e dedicados. Gostaria de destacar um aspecto importante resultante deste filme: o facto de Hattie McDaniel ter sido a primeira actriz negra galardoada com um Óscar pelo seu papel secundário como Mammy.
É bastante difícil tentar resumir uma história por vezes tão exaustivamente retratada durante os mais de 220 minutos de duração do filme, as palavras não bastam e o melhor é mesmo vê-lo. A duração parecerá excessiva para muitos, no entanto pensem que a primeira versão do argumento de Sidney Howard daria para cinco horas e meia de filme! Existem muitos aspectos interessantes como, por exemplo, o modo como a câmara se afasta de Scarlett quando esta cuida dos feridos no hospital e o ecrã enche-se com os uniformes cinzentos dos soldados, Atlanta a arder enquanto Rhett ajuda Scarlett a fugir, a famosa cena em que Scarlett agarra um pouco da terra vermelha e perante um céu cor de fogo (acompanhada pela música de Max Steiner) jura a si mesma nunca mais fazer fome e tudo fazer para manter tarae o uso da Technicolor (nomeadamente a partir dos anos 30) que magicamente aumenta com o brilho da cor o encanto de um filme que perdura até aos dias de hoje e ainda nenhum dos grandes realizadores da nossa época se “atreveu” a fazer um remake desta história de amor numa civilização "levada pelo vento".

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